quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

CIRO II, O GRANDE (559 - 530 a.C.) - PARTE V

Os detalhes da morte de Ciro variam nas fontes. O relato de Heródoto em sua História informa que Ciro encontrou sua morte em uma feroz batalha contra os massagetas, uma tribo dos desertos do sul de Khwarezm e Kum Kyzyl na porção sul da região de estepes dos atuais países do Cazaquistão e o Uzbequistão. Abaixo, as campanhas de Ciro (552 a 530 a.C.). No canto direito superior está assinalada a derradeira batalha do fundador do Império Aquemênida.

Segundo Heródoto, Ciro, seguindo o conselho de Creso, ex-rei da Lídia, atacou os massagetas em seu próprio território. Os massagetas estavam relacionados com os citas no seu modo de vida; eles lutavam a cavalo e a pé. Para conquistar seus domínios, possivelmente visando à segurança das fronteiras de seu império, Ciro enviou uma oferta de casamento a sua governante, a Rainha Tomiris (Tahm-Rayish), que rejeitou a proposta. Ele então começou sua campanha para tomar pela força o território dos massagetas, iniciando a travessia do rio Axartes, que separava os dois domínios. Abaixo, o rio Axartes (atual Syr Darya) que formava a fronteira entre os territórios persas e os dos massagetas.


Tomiris, a nêmesis de Ciro
A rainha Tomiris por
Andrea Castagno (1450)
Tomiris enviou-lhe uma advertência para que cessasse a invasão, advertência esta que ela já esperava que seria ignorada; então Tomiris desafiou Ciro para confrontarem suas forças numa guerra honrada. Ele aceitou a oferta, mas ao saber que os massagetas não estavam familiarizados com o vinho e os seus efeitos, armou um estratagema no qual deixou para trás um acampamento com abundância de víveres e vinho levando seus melhores soldados consigo e deixando os menos capazes. O general do exército de Tomiris, Spargapise, que também era seu filho, liderando um terço das tropas massagetas derrotou o grupo que Ciro havia deixado encontrando o acampamento bem abastecido com comida e vinho. Os massagetas embebedaram-se, diminuindo assim a sua capacidade de defender-se; então sofreram um ataque surpresa sendo derrotados. Depois que recuperou a sobriedade, Spargapises, envergonhado, cometeu suicídio. Ao saber do que havia acontecido, Tomiris, indignada com a dissimulada tática de Ciro, jurou vingança conduzindo ela mesma uma segunda força de guerreiros massagetas para a batalha. Ciro foi finalmente morto e suas forças sofreram numerosas baixas. Heródoto refere-se a esse embate como a mais feroz batalha da carreira de Ciro e também do mundo antigo. Ao término da batalha, Tomiris ordenou que o corpo de Ciro lhe fosse trazido e em seguida decapitado. Ela mergulhou a cabeça do grande rei persa num odre de sangue em um gesto simbólico de vingança por sua sede de sangue pela morte de seu filho. Esse relato inspirou à arte.
Tomiris e a cabeça de Ciro por Mattia Pretti
O nome do Tomiris apareceu na literatura clássica como um arquétipo da mulher guerreira, juntamente com outras figuras bíblicas e históricas: Jael. Judite, Zenóbia, Hipsicratea e Camilla. Uma comédia histórica renascentista espanhola foi dedicada à sua figura: Qual é o Afeto Maior ou Triunfo de Tomiris. A pintura também imortalizou Tomiris nas obras de Rubens e Gustave Moreau dentre outros. No entanto, alguns estudiosos questionam esta versão da morte de Ciro, principalmente porque Heródoto admite que este evento foi uma das muitas versões da morte de Ciro que ele ouviu de uma fonte supostamente confiável que lhe disse que ninguém estava lá para ver o ocorrido. No entanto, outros sugerem que as tropas persas podem ter mais tarde recuperado o corpo depois de o mesmo ter sido crucificado, que foi também após sua decapitação, dentre outras hipóteses. Ctesias, na obra Persica, tem um relato mais longo e diz que Ciro encontrou a morte quando enfrentou a resistência da infantaria da tribo dos derbices, auxiliados por outros arqueiros e a cavalaria dos citas, além de indianos e seus elefantes. Segundo ele, este evento realizou-se a nordeste da cabeceira do Syr Darya. Uma explicação alternativa na Ciropédia de Xenofonte contradiz os outros, afirmando que Ciro morreu pacificamente em sua capital Pasárgada. O Grande Rei ordenou que seu corpo fosse enterrado na terra, em vez encerrado em prata ou ouro (Ciropédia 8.7.25). Alguns estudiosos acreditam que esta versão está enraizada na tradição persa. Abaixo, ruínas do palácio de Ciro, o Grande, em Pasárgada.


Outra versão da morte de Ciro vem do historiador babilônico Beroso que relata apenas que Ciro encontrou a morte quando em guerra contra os arqueiros da tribo iraniana dos dahae ao noroeste da cabeceira do rio Syr Darya. Embora não seja possível agora discernir os fatos precisos da morte de Ciro, é sabido que ele foi enterrado em Pasárgada (hoje Mashad Morḡāb-e). Abaixo, ilustração do mausoléu de Ciro como deveria ser na época do esplendor do Império Aquemênida.


Este fato parece desmentir os detalhes relatados por Heródoto, mas é possível que o corpo de Ciro tenha sido recuperado do inimigo e levado para a capital; Ctesias sustentou que Cambises mandou um certo Bagapates para resgatar o cadáver de Ciro para o funeral em Pasárgada. Há em Pasárgada um túmulo que muitos acreditam ser o de Ciro. Na literatura antiga, Estrabão e Arriano dão descrições quase idênticas do túmulo, com base no depoimento de Aristóbulo de Cassandréia, que, por instigação de Alexandre, o Grande, visitou o túmulo duas vezes. Embora a cidade em si esteja agora em ruínas, o mausoléu de Ciro, o Grande, se manteve praticamente intacto e foi parcialmente restaurado para impedir sua deterioração natural ao longo dos anos. De acordo com Plutarco, o epitáfio do túmulo dizia: "Ó homem, quem você é e de onde quer que venha, pois eu sei que você virá, eu sou Ciro, que conquistou aos persas o seu império. Portanto, não tenha rancor por este pouco de terra que cobre meu corpo” (Vida de Alexandre, 69. Inscrições semelhantes são dadas em por Arriano e Estrabão). Abaixo, o mausoléu de Ciro, o Grande, nas ruínas de Pasárgada.



O Legado de Ciro, o Grande
A evidência escrita cuneiforme proveniente da Babilônia mostra que Ciro morreu em torno de dezembro de 530 a.C. e que seu filho, Cambises II, se tinha tornado rei. Cambises continuou a política de expansão de seu pai e conseguiu conquistar o Egito para o Império Persa, mas morreu depois de apenas sete anos de governo. O Império manteve-se, mas sob constante perturbação política, até que Dario I, que se casou com uma das filhas de Ciro, assumiu o trono e restabeleceu a ordem. Abaixo, a extensão do império persa sob Ciro, o Grande, sobreposta sobre as fronteiras modernas:Turquia, Israel, Geórgia e Arábia, a oeste; Cazaquistão, Quirguistão, o rio Indo e Omã, a leste. Sob Ciro, a Pérsia se tornara o maior império do mundo já tinha visto.

Ciro tornou-se uma referência de grande estadista não apenas por causa de suas conquistas, mas pela singularidade de sua administração que respeitava a cultura e religião dos povos conquistados. A Bíblia registra, como já anteriormente citado, o impacto que a vitória de Ciro sobre os babilônios causou nos judeus: para eles era o ungido do Senhor.  Foi ele quem deu ordens para a reconstrução do templo de Jerusalém (2Crônicas 36:23, Esdras 1:02, 5:13, 6:03), que fossem restaurados os utensílios da casa do Senhor que Nabucodonosor tinha tomado (Esdras 1:07), e disponibilizou recursos para trazer cedros do Líbano (Esdras 3:7) para a reconstrução do templo. Verdade é que ele também restaurou os templos dos babilônios, e trouxe de volta as imagens dos deuses para seus santuários. Não obstante o profeta Isaías o chama de pastor e ungido do Senhor (44:28; 45:1). Abaixo, ilustração de Gustave Doré sobre a restauração dos vasos sagrados dos judeus por Ciro.

Contra todas as tradições dos impérios antecedentes, o império de Ciro deu uma certa autonomia aos povos que conquistara respeitando suas religiões e tradições próprias. Os babilônios o tinham como seu libertador já que estavam insatisfeitos com a política religiosa de Nabonido. As evidências mostram que eles tinham confiança em sua benevolência como conquistador e governante. A visão grega registrada na Ciropédia de Xenofonte registra a admiração que os gregos (que anos mais tarde enfrentariam os persas) tinham  por Ciro. Os iranianos, seu povo, o chamam de Pai e tem muito orgulho de seu ancestral. A vida de Ciro tal como relatada na Ciropédia de Xenofonte inspirou muitos estadistas dos quais Thomas Jefferson, 3º presidente dos EUA. Não é sem motivo que ele foi cognominado de o Grande.


REFERÊNCIAS:
http://en.wikipedia.org/wiki/Cyrus_the_Great
http://es.wikipedia.org/wiki/Ciro_II_el_Grande
http://www.iranica.com/newsite/index.isc?Article=http://www.iranica.com/newsite/articles/v6f5/v6f5a026.html
http://en.wikipedia.org/wiki/Nabonidus
http://en.wikipedia.org/wiki/File:The_Conquests_of_Cyrus_the_Great.png
http://www.historyfiles.co.uk/KingListsFarEast/AsiaMassagetae.htm
http://www.internationalstandardbible.com/C/cyrus.html

9 comentários:

  1. Olá Joalsemar, gostaria de saber se, por acaso< você sabe o que há dentro do túmulo. O corpo de Ciro ainda está ali ou o túmulo está vazio e só há o monumento mesmo?
    Agradeço a atenção.

    Sergio
    scm_ai@yahoo.com.br

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  2. Não há confirmação quanto ao conteúdo do túmulo, o que é natural visto que por seculares gerações o túmulo foi considerado o de Ciro, o Grande, e extremamente respeitado e portanto não profanado ou aberto. O testemunho dos historiadores greco-romanos sobre a localização e aparência do túmulo condizem com o que tem sido secularmente identificado. Até o presente momento nada contesta essa identificação.

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  3. Muito obrigado. Curioso não terem profanado o túmulo, mesmo após séculos. Os muçulmanos fazem isso sempre e mesmo a comunidade científica o faz, principalmente no Egito. Pois parece que o túmulo de Ciro fica no meio do nada e sem nenhuma proteção aparente. De qualquer forma, é um fato muito interessante.
    Abraços e Obrigado
    Sergio

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  4. Os iranianos, embora muçulmanos, são muito orgulhosos do seu passado histórico, mesmo antes da islamização dos persas; por isso tendem a preservar e enaltecer sua herança histórica. Em abril de 2007 houve protestos contra a construção de uma represa que poderia inundar a região e destruir o túmulo e arredores. Não consegui ter ainda informação recente, mas o túmulo ainda está lá. Abraços.

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    1. Parabéns pela matéria e a ótima observação referente aos iranianos, pois são os maiores preservadores da história na atualidade.

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  5. POR RAZOES OBVIAS, SOU APAIXONADA POR CIRO, ESSE É UM SER QUE ME INSPIRA E ME INTRIGA. SE POSSIVEL, GOSTARIA DE OBERTE MAIS INFORMAÇÕES SOBRE CIRO E TAMBEM SUA ESPOSA CASSANDRA. GRANDE ABRAÇO.

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  6. Para maiores informações sobre Ciro consulte as páginas da web nas referências ao fim da postagem.Recomendo o artigo da Enciclopédia Irânica:
    http://www.iranicaonline.org/articles/cyrus-iii

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  7. Grande trabalho! O mais completo que encontrei.
    Mas gostaria de perguntar, se sabe onde posso encontrar alguma fonte que diga detalhadamente as táticas de Ciro.
    Você contou muito bem todas as batalhas, mas gostaria de saber pelo menos como era seu exército. Afinal de Alexandre se encontra em qualquer lugar estas informações.
    Qualquer informação me avise.
    Obrigado

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    1. Obrigado por suas palavras e fico feliz em ter contribuído. Você pode consultar a página em inglês da Wikipédia sobre Ciro no qual há muitos links sobre as batalhas de Ciro com algumas descrições do exército e manobras. Segue o link abaixo:
      http://en.wikipedia.org/wiki/Cyrus_the_Great#Rise_and_military_campaigns

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